YOON é um documentário português, do género road movie, que acompanha a diligente mas intricada viagem de Mbaye Sow, um senegalês a residir em Portugal, entre os dois países a que chama casa – Portugal e Senegal.
Sempre acompanhado por um velha carrinha Peugeot 504 e ao longo de mais de 4000 quilómetros, Mbaye entrega-se a uma viagem perigosa para sul mas nunca solitária, repleta de encontros e desencontros e de todo o tipo de compromissos e desafios. Mesmo nos lugares de passagem que representam as zonas cinzentas desta árdua jornada e mesmo onde é preciso navegar numa complexa rede de relações, pactos e acordos, este homem caminha para o infinito ancorado por uma elevada e nobre camaradagem de estrada.
Ricardo Falcão e Pedro Figueiredo Neto, os realizadores, não fazem questão de aparecer ou ser ouvidos, entregando os diálogos a Mbaye Sow e a todos os familiares, amigos e companheiros que com diversos materiais, produtos e artigos lhe enchem o carro para que a transposição de fronteiras seja o garante da dissolução da saudade. Como disse Jorge Mourinha (Ípsilon) e bem: “Yoon é um retrato de um moderno capitalismo mercantil desenrascado, olhar sobre um homem em constante limbo entre primeiro, segundo e terceiro mundo”.
Na verdade, nunca poderemos dizer que se trata de uma viagem solitária pois o telefone de Mbaye nunca para de tocar. Aliás, o mesmo quase nunca é retirado da ficha do carregador. São inúmeras as chamadas da mulher, dos filhos e de amigos que o contactam para saber onde se encontra, quanto tempo falta para chegar e se o material que este transporta ainda está em condições. A paisagem do Norte de África, essa vai mudando. Ora vemos um deserto infindável, ora presenciamos rios e lagos, ora estamos numa rua movimentada do Senegal. O panorama estético da paisagem enche a vista ao espectador desta viagem, na qual, muitas vezes, nem o próprio condutor pode usufruir dessa visão.
Com efeito, toda a narrativa segue uma linha cronológica perecível – preparar a carrinha, enchê-la com o material, fazer-se à estrada, conduzir, chegar, entregar a mercadoria e retornar. É este o ciclo que deve ser cumprido. É esta a meta. Mas uma meta também filosófica e metafórica. Ao longo da viagem, o espectador vai presenciando uma mudança física, concretizada nas transformações e reparos que a carrinha verifica, algures em Marrocos, dado o peso e a corrosão da viagem. São estes consertos, são estes arranjos e reparos que nos levam também à visualização da transformação do Homem, à sua emenda, correcção e melhoria.
Desta forma, YOON é um filme sobre encontros e desencontros com grupos improváveis: com routiers como Mbaye, com mecânicos, com a polícia e as autoridades fronteiriças, com migrantes, com os os destinatários das bagagens que transporta, com os potenciais compradores mas sobretudo com a sua família. O aspecto mais relevante de YOON é a sua afirmação idiossincrática, ou seja, a forma como a personagem se apropria da estrada e da forma como esta se apresenta e representa como um meio de subsistência. Para Mbaye, o caminho, o trilho que percorre, é uma fonte de liberdade, de superação e provação mas também de aventura e, no final, no atingir de um certo reconhecimento social (status).
Por outro lado, YOON também fica marcado como um filme que procura refletir a questão das fronteiras e do fluxo de bens e pessoas entre a Europa e África. Aqui é encontrada uma certa obsolescência e decadência material nas periferias urbanas das grandes cidades, no entanto, através de routiers como Mbaye, o público é confrontado com a mutabilidade da produção e da destruição material que presentemente tem lugar nos grandes centros urbanos.
Concluindo, Mbaye afirma constantemente que “só está de passagem”. Mas o que é estar de passagem? O que significa a sua demora num lugar como Marrocos? O que significa querer ir rápido embora de sítios como a desconhecida Mauritânia? Chegar a casa será a resposta. Mas qual é mesmo a casa de Mbaye?