Comédia romântica… Género tantas vezes menosprezado e sobranceiramente visto como algo menor, de mau gosto, a chamada xaropada. Género com caderno de encargos rígido com princípio, meio e fim. Será mesmo assim? Nos últimos anos a comédia romântica tem vindo a desaparecer das grandes salas. Gerações de actores e actrizes que se celebrizaram no género, como aqui George Clooney e Julia Roberts, mas que por algum motivo deixaram de fazer parte destas produções de alto orçamento, estando o género hoje em dia relegado quase exclusivamente para as plataformas de streaming como a Netflix, com baixo orçamento e actores pouco memoráveis.
Porque está a comédia romântica fora de moda? Há várias razões para isso. A comédia romântica tradicional é um género que assenta sobretudo em estereótipos masculinos e femininos, normalmente da classe média, utilizando a “guerra de géneros” como mote para a sua trama, desde a melhor amiga que ajuda a protagonista a ultrapassar um coração destroçado, ao protagonista inseguro que decide ter a coragem de ir atrás da mulher dos seus sonhos. Em 2022 entende-se que seja difícil defender esses valores e estereótipos no grande ecrã, numa era em que o cinema está precisamente a afastar-se deles de forma activa. Isso, aliado à falta de interesse do público jovem em ver tais histórias (público jovem que foi outrora o público alvo do género), fez com que o género esteja quase morto e enterrado.
Isso traz-nos à realidade que é Ticket to Paradise, um callback a um género perdido no tempo com os mesmos protagonistas desse tempo ido. A amostra da sala estava certa: bem composta a um sábado à tarde, com um público de casais na casa dos 50 anos, o público que cresceu habituado a ver fantásticas comédias românticas como As Good as It Gets, When Harry Met Sally, Pretty Woman ou Notting Hill. George Clooney e Julia Roberts, excelentes representantes do género, estão de regresso.
A química entre Clooney e Roberts é inegável. Esse é, e não qualquer outro, o grande vector de Ticket to Paradise, a história de um casal divorciado há 20 anos que decide unir forças para impedir que a filha cometa o maior erro que eles próprios cometeram: casar. Não há como resistir. Quando o casal está no ecrã a nostalgia existe e as interpretações são magnéticas, cómicas e funcionam na perfeição. O problema é tudo o resto. Apesar de uma premissa suficientemente engraçada para motivar o filme, quase todo o adorno teima em resultar. A filha e o seu príncipe encantado (Kaitlyn Dever e Maxime Bouttier) oferecem momentos que, por muito boa vontade que se tenha, não conseguem fugir à vergonha alheia. Sendo isso quase a metade do filme, na ausência das suas duas grandes estrelas, o desequilíbrio é evidente. A produção e realização são também um tiro ao lado, com um tratamento de imagem irrealista e efeitos a computador dúbios que pretendem levar o espectador a crer que o filme está a ser filmado em Bali, quando na realidade está a ser filmado na Austrália. A forma como a cultura indonésia está glamorizada, momentos slow motion e spins sobre o jovem casal apaixonado, entre outros clichés, são um corte difícil de superar. É como se estivéssemos a assistir a dois filmes. Ainda assim, todos os momentos em que George Clooney e Julia Roberts brilham no ecrã entregam tudo aquilo que se pede: química, carisma e charme. E isso quase permite esquecer todas as falhas deste bilhete para o paraíso. Ticket to Paradise não é nada de se deitar fora. Mas também não é o regresso à boa forma que o género tanto precisa, nem tão pouco a reformulação da fórmula para um público alvo mais jovem. Antes pelo contrário. É um filme saudosista destinado à geração que viu Clooney e Roberts, jovens como eles, interpretar estes mesmos papéis há 30 anos atrás.