The Feast, de Lee Haven Jones: Quando a Terra Faz o Seu Prato

Carla RodriguesMarço 4, 2025

Há filmes que não se impõem com estrondo, mas que, pé ante pé, vão apertando o cerco até deixarem qualquer um a contorcer-se no assento. The Feast, longa-metragem de estreia do realizador Lee Haven Jones, encaixa-se precisamente nessa categoria. Um verdadeiro exercício de slow burn, The Feast (Gwledd, no seu original galês) é um pedaço de terror ecológico que vai envolvendo o espectador num nevoeiro de desconforto denso e persistente.

O pano de fundo do filme é um qualquer canto rural do País de Gales. Uma região onde o verde ainda impera, onde as comunidades giram à volta da terra e da agricultura. É com estranheza, então, que este cenário pastoral se deixa fender por uma casa envidraçada, pós-modernista, de ângulos retos e frios. A sua presença é uma interrupção da harmonia natural, um prenúncio de que há aqui algo fora de lugar. E, tal como esta casa rompe com a paisagem, também os laços familiares no seu interior procuram esconder, sob a capa da afluência, os rasgos que os ameaçam romper.

A casa pertence a uma família abastada que, neste dia, prepara um jantar importante – o titular banquete. Mais do que um jantar, é um encontro com uma agenda oculta. É fundamental que corra bem. Fiel ao seu estatuto, a família contrata uma ajudante local para assegurar que tudo decorre sem falhas. A jovem, porém, traz consigo um silêncio inquietante, uma presença que, ao invés de ser apenas funcional, parece ser o catalisador de algo mais sombrio. Há algo que se insinua de forma ténue – uma força que quer irrompe de fora, quer emerge das fissuras internas da própria família, corroída por uma ganância multifacetada.

 

 

Jones evita o susto fácil, optando antes por um ritmo deliberado, que exige paciência ao espectador (paciência essa que vem a ser recompensada). O terror, além de altamente alegórico, é silencioso, enraizado em ecos de misticismo rural e em ansiedades ambientais cada vez mais pertinentes. Há uma certa opacidade em tudo isto que, a espaços, se torna frustrante, mas que acaba por ser uma ferramenta eficaz para provocar o espectador e estimular a discussão sobre os temas que se apresentam.

As interpretações, de carácter minimalista, são eficazes, alinhando-se com a abordagem contida deste filme que faz da economia de recursos a sua maior força. Apesar da localização única, The Feast nunca é aborrecido, e muito disso se deve à cinematografia de Bjørn Ståle Bratberg. Os planos abertos captam a serenidade da paisagem natural e contrastam de forma inquietante com a frieza clínica do espaço doméstico. A casa, com os seus corredores sombrios e espaços estéreis, torna-se palco de um certo voyeurismo: as personagens observam-se, medem-se, presas numa dança de desconfiança e tensão.

 

 

The Feast não é um filme para quem procura sustos imediatos. É uma fábula sombria sobre ganância, destruição e a lenta – mas inevitável – vingança da natureza. No fim, The Feast serve um prato cheio de desconforto, e impõe um lembrete indigesto: a terra observa, paciente, e um dia, cobra a sua conta.

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Carla Rodrigues