Terrifier 3, de Damien Leone: A Prenda Mais Sangrenta do Ano

Carla RodriguesNovembro 27, 2024

Entre Terrifier 3 e Joker: Folie à Deux, Outubro trouxe-nos o duelo de palhaços mais aguardado do ano – uma espécie de Jokerifier, ou Terrifioker se quiserem. E, surpreendentemente, o psicopata mais obscuro saiu vitorioso. No fim de semana de estreia, Terrifier 3 arrecadou o primeiro lugar nas bilheteiras americanas, ultrapassando Joker: Folie à Deux no seu segundo fim de semana. E não foi uma vitória qualquer: arrecadou mais de 2,5 vezes o valor do rival. Enquanto Terrifier 3 impressionou com 18,3 milhões de dólares no mercado dos Estados Unidos, o segundo capítulo de Joker ficou-se pelos 7 milhões. Mesmo com Joker 2 no seu segundo fim de semana, foi impressionante ver Terrifier 3 não só superá-lo, mas fazê-lo com uma margem tão ampla. Para um filme de nicho, com uma classificação restritiva e uma abordagem gráfica sem pudor, isto é notável.

Então, como é que isto aconteceu?

Terrifier 3

A saga Terrifier (enraizada na tradição teatral do Grand Guignol) começou a encher os nossos ecrãs de sangue e tripas em 2011 pelas mãos de Damien Leone. O primeiro filme, produzido com um orçamento ínfimo de 35 mil dólares, conseguiu maximizar os seus recursos apostando em efeitos práticos criativos e meticulosamente bem executados. O retorno foi bom — quase meio milhão de dólares, o suficiente para fazer sonhar com sequelas do mesmo potencial financeiro. Foi com Terrifier 2, em 2018, que o estatuto de culto se consolidou. Com violência gráfica sem filtros, a saga conquistou um público fiel, arrecadando mais de 10 milhões de dólares a partir de um orçamento de 250 mil dólares. Art, o palhaço assassino, mudo e maníaco da saga, tornou-se um ícone, realeza dos slashers. David Howard Thornton interpreta-o com maneirismos deliciosos, que remetem para Chaplin ou Buster Keaton, mas o sangue que deixa pelo caminho está bem mais próximo dos litros derramados por Jason, Michael Myers ou Freddy Krueger todos juntos.

Com tanto sucesso acumulado, Terrifier 3 tinha a responsabilidade de estar à altura das expectativas. Conseguiu?

Sim. Muito graças à alquimia entre misturar a mais gráfica brutalidade com uma boa dose de brincadeira. É isso que faz estes filmes funcionarem, um baloiço ensanguentado entre gore de fazer revirar o estômago e humor slapstick. Art é uma bola de carisma, um relâmpago de caos — um Jackson Pollock sangrento que combina o perturbador e o ridículo de forma genial. Com o dedo no pulso do ridículo, descobrimos neste filme que Art é um fã excêntrico e devoto do Pai Natal. Claro, é uma questão de tempo até se vestir como ele. Há algo intrinsecamente hilariante — e perturbador — em ver Art transformar o espírito festivo num espetáculo de terror. Sempre sem falar, mas recorrendo a todo o tipo de contorções faciais e gestos exagerados, o histriónico palhaço subverte a imagem do bonacheirão Pai Natal de uma maneira anárquica. Afinal, Art está aqui para destruir convenções, sejam sociais ou cinematográficas.

Terrifier 3

Mas nem tudo é perfeito. O filme perde-se quando tenta justificar a sua mitologia. Introduzir tanto lore num universo onde o público está mais interessado em desmembramentos criativos do que em histórias de origem é sempre arriscado. As tentativas de explorar as vidas dos personagens humanos acabam por parecer cenas descartadas de um filme de domingo à tarde, com diálogos fracos e iluminação pobre. Estas sequências fazem o filme travar a fundo e sente-se que Terrifier 3 tem uma duração que não precisava de ultrapassar as duas horas.

Ainda assim, os efeitos práticos não desiludem. Uma verdadeira masterclass de como fazer gore. Revoltantes, gráficos e absolutamente extremos, são uma celebração técnica que exala paixão (e, sim, muitos outros fluidos). É essa dedicação que transforma Terrifier numa história de sucesso: uma saga que, com orçamentos minúsculos e criatividade ilimitada, desafia as probabilidades e conquista fãs e bilheteiras.

Que um filme destes tenha tido uma abertura de mais de 18 milhões de dólares é uma espécie de conto de fadas retorcido e uma prenda de Natal antecipada para todos aqueles que se regozijam pelas vitórias do cinema de género. Terrifier 3 é mais do que uma exibição de carnificina gráfica; é uma carta de amor ao terror enquanto expressão cultural subversiva e catártica. A saga de Damien Leone não é apenas sobre sangue e vísceras — embora as tenha em abundância —, mas sobre o regresso à essência do terror como uma experiência visceral, feita para chocar, divertir e, de certa forma, libertar. Art, o Palhaço, simboliza esse espírito anárquico, rasgando convenções e relembrando-nos de que o terror pode ser tão lúdico quanto brutal.

Enquanto filmes como Hereditary, Midsommar ou The Witch elevam o género ao status de arte, Terrifier celebra o caos. E há lugar para ambos. O sucesso de Terrifier 3 é a prova de que o público deseja experimentar o terror em toda a sua amplitude.

Carla Rodrigues