De um dia para o outro, Vincent é repetidamente atacado, sem sentido, por pessoas que o tentam matar. A sua existência pacata é virada do avesso… Depois de uma passagem pelo Motelx 2023, Vincent Tem de Morrer (Vincent Doit Mourir), curiosa primeira longa-metragem do francês Stéphan Castang, estreou na passada semana nas salas de cinema portuguesas. Três tribunos deixam-nos aqui a sua crítica.
Vincent Tem de Morrer é um thriller de elevada violência física, um drama que aborda o apocalipse civilizacional, não no aspecto destrutivo do mundo físico mas sim o dos humanos. Esta obra desenrola-se como metáfora para a insegurança, a desconfiança e o ataque gratuito, características e sensações que identificam e representam uma elevada fatia da sociedade actual. Vincent é um homem banal, arquitecto regular, sem grande aura e carisma, que é espancado por dois colegas de trabalho. A justificação para o acto bárbaro fica inicialmente no ar mas rapidamente se percebe que o novo vírus pandémico não atinge o quadro clínico dos humanos mas sim a vertente mental e psicológica, por meio de ataques físicos e desumanos. Vincent começa então uma fuga desesperada de forma a extinguir qualquer confronto com a brutalidade dos seus semelhantes pois é através da troca de olhares que a violência se instala. O filme tem um compasso acelerado e a abordagem ao tema é quase sempre feita de forma humorística e hilariante, podendo arrasar pessoas mais sensíveis.
Rita Cadima de Oliveira
Este misto de comédia negra e pandemia pós-apocalíptica francesa acompanha um sujeito comum que subitamente começa a ser atacado por pessoas de forma aleatória para onde quer que vá. A originalidade ninguém lhe tira (coincidentemente existe algo de Beau is Afraid nesta insanidade) e a interpretação de Karim Leklou relembra o comum “vizinho” que todos temos que de repente vê o Mundo virado contra si. A comédia negra e a violência algo extrema fazem deste Vincent Tem de Morrer uma clara proposta de cinema género incomum, oferecendo ao espectador um misto de sensações, do riso ao nojo, da raiva à compaixão, que irá sem dúvida encontrar o seu nicho e, quiçá, tornar-se filme de culto.
David Bernardino
Vincent Doit Mourir marca a estreia do realizador francês Stéphan Castang no formato de longa metragem. Estreia auspiciosa, por sinal, alicerçada no rosto do protagonista, interpretado por Karim Leklou, e no desembaraço com que o cineasta vai mesclando vários géneros cinematográficos de forma e tom bastante equilibrados. O espetador vai descobrindo juntamente com o personagem principal, que o mesmo padece de uma condição que faz com que seja violentamente atacado por quem com ele cruze o olhar. Esta premissa algo absurda, funciona como ponto de partida para Castang explorar, através do cinema de género, a metáfora da violência na sociedade, sem grandes explicações nem mensagens condescendentes para com o espectador. Vincent Doit Mourir é simultaneamente drama social, comédia física, zombie movie e romance. Uma análise detalhada às várias expressões faciais possíveis de arrancar a Karim Lelouch. Um filme político sobre ver e ser visto, em todas as aceções da palavra.
Bruno Victorino