A mais recente longa-metragem de Rodrigo Moreno, membro do chamado “novo cinema argentino”, estreou recentemente nas salas de cinema portuguesas. Los Delincuentes tem sido muito bem recebido pela crítica. Rita Cadima de Oliveira e David Bernardino não ficaram convencidos e deixam-nos aqui a sua crítica ao filme.
O crime compensa. As três horas de filme, não. Em tom algo descompensado, Rodrigo Moreno destratou a edição e a montagem de um filme seco e existencialista que teria tudo para dar certo mas que acaba por reiterar a fala de uma das personagens: “O cinema está morto”. Não estando morto, aborrecido aqui está de certeza. À pergunta “preferes trabalhar mais vinte anos ou estar preso três?”, devemos responder com um furto monetário sem sal e desprovido de emoção!? Que roubo sem alma. Nem nas belas ruas de Buenos Aires, repletas de néones no seu lusco-fusco, sempre tão apinhada e com tanta gente a conviver, se retira algum tempero. Desde entregar dinheiro inserido num saco de ginásio no império da mozzarella a tornar-se num pós-presidiário livreiro, Os Delinquentes pretendem ter tanto de Afire como de Heat, impondo a miséria anexa à existência rotineira como desculpa para amenizar o crime. Acontece que, pelo meio, há um regurgitar sucessivo de actos desorientados e um grupo de pessoas chamadas: Román, Morán, Ramón, Norma e Morna. E há também a definição de conceitos: cineasta vs. videasta. Enfim, uma salganhada.
Rita Cadima de Oliveira
O início d’Os Delinquentes é interessante. O dia a dia dos trabalhadores de um banco, as suas relações, o seu chefe, os seus clientes, num ecossistema realista dominado pelo “sistema”. O sistema é posto em causa quando um dos trabalhadores decide assaltar o banco, de forma hiper minimalista, no valor que receberia através do seu salário até ao fim da sua vida activa. Prefere cumprir uma pena de 4 anos a trabalhar mais 25 anos. É este o poderosíssimo conceito do filme, uma reflexão sobre se o crime compensa, o vazio e o sanguessuguismo do trabalho moderno, dos trabalhadores das 9h às 17h. Enquanto o protagonista aguarda na prisão surge-nos outro protagonista, o amigo que guarda o dinheiro cá fora, que lida com essa pressão. Preparamo-nos mentalmente para um standoff final sobre afinal o que irá acontecer a este dinheiro. No entanto, o realizador Rodrigo Moreno tem outros planos. Realizando um filme de 190 minutos, a narrativa evolui para algo completamente diferente na ordem do desenvolvimento de personagem desgovernado com laivos de romance campestre. Às tantas o filme parte-se em dois, duas partes tão distintas que parecem não pertencer à mesma película. Como se originalmente se tratasse de um telefilme a ser exibido em duas partes na televisão nacional (como por cá fizeram com A Herdade, por exemplo). Los Delincuentes torna-se um carro desgovernado, sem saber muito bem por onde ir ou como terminar, uma amálgama de conceitos que às tantas se torna aborrecida e pouco recompensadora para um filme de mais de 3 horas que parece sofrer uma crise de identidade. Infelizmente, Los Delincuentes foi uma desilusão…
David Bernardino