Ir ao Cinema em Lisboa está a tornar-se cada vez mais uma verdadeira aventura. Ou deverei dizer, festa? (Sim, eu sei que fora desta realidade as coisas são bem distintas e a minha palavra de solidariedade vai para os demais cineclubes e auditórios municipais portugueses que nunca desistem e que persistem na adversidade cultural e audiovisual). Em primeiro lugar, urge, com alguma antecipação, verificar se há disponibilidade na sala. As sessões estão cada vez mais aglomeradas (de gente faladora e barulhenta) e é preciso verificar previamente se ainda há bilhetes disponíveis e comprá-los online. Para os antigos que ainda gostam de coleccionar bilhetes, urge ir para a fila do cinema, quase uma hora antes, com vista a comprar as entradas para os lugares menos apertados ou incómodos, dado o crescente desconforto dos assentos e o espaço mínimo entre filas, ou até mesmo para nos serem impingidos os trezentos mil doces, gomas, chocolates e tipos de pipocas disponíveis, a par do merchandising e afins que nos são “marketingamente” tentados de forma semelhante às senhoras dos CTT a impor cautelas e raspadinhas aos reformados. Acresce a isto, o facto do mesmo filme estar disponível em 3 ou 4 salas pois temos a possibilidade de o ver em 2D, 4D, 4DX, XVision, Screen X e IMAX. E escolher? E saber escolher? Por outro lado, existe ainda toda uma questão estética. O que vestir para enfrentar as temperaturas siberianas de uma sala de cinema? Quantos casacos devemos nós levar por precaução? Mas bem, não é isto que importa. Ou é?
Foi um ano exaustivo mas bom. Um ano intenso de cinematografias várias e de presença em diversas salas lisboetas, graças à dedicação e versatilidade de cinemas como o Nimas, o Ideal, o Fernando Lopes, Cinema City Alvalade e UCI. Na minha lista estão inseridos filmes de diversas categorias: a sempre e marcante presença do drama (Le Otto Montagne; Perfect Days; Godland); a força revolucionária do documentário (All The Beauty and The Bloodshed; Águas do Pastaza; Yoon); a não tão subtil mensagem dos filmes de animação (menção honrosa para Elemental de Peter Sohn) e o relevante peso dos coming-of-age (Astrakan; Falcon Lake). Tentei ser espectadora assídua de um cinema tão europeu (Godland; Anselm; El Agua) quanto árabe (Under The Fig Tree; Dirty, Difficult, Dangerous;), canadiano (Falcon Lake) e sul-americano (Trenque Lauquen). Confesso que da América do Norte, este ano, pouco ou nada me entusiasmou. Aproveito a deixa para afirmar que Barbie, Oppenheimer, Killers of The Flower Moon, Maestro, May December e Knock At The Cabin foram, para mim, as desilusões do ano. Exageradamente longos, de algum pretensiosismo e com proeminente overacting, confesso estar enfastiada com o “mais do mesmo” norte-americano. Por oposição, em 2023, devo destacar a forte assiduidade e irreverência da cinematografia portuguesa, destacando Mal Viver, Águas do Pastaza, Cidade Rabat, Diálogo de Sombras, a Sibila e Yoon como filmes que me exaltaram a confiança e satisfação de que nem tudo vai mal no meu país.
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Os Melhores Filmes de 2023
01 Le Otto Montagne / As Oito Montanhas, de Felix van Groeningen
02 Perfect Days / Dias Perfeitos, de Wim Wenders
03 Anselm, de Wim Wenders
04 Trenque Lauquen, de Laura Citarella
05 Nostalgia, de Mario Martone
06 All The Beauty and The Bloodshed, de Laura Poitras
07 Mal Viver, de João Canijo
08 Águas do Pastaza, Inês T. Alves
09 Burning Days / Dias em Chamas, de Emin Alper
10 Dirty, Difficult, Dangerous / Sujo, Difícil, Perigoso, de Wissam Charaf
11 Falcon Lake, de Charlotte le Bon
12 Astrakan, de David Depesseville
13 Under The Fig Tree / Debaixo das Figueiras, de Erige Sehiri
14 Diálogo de Sombras, Júlio Alves
15 20000 Espécies de Abejas, Estíbaliz Urresola
16 Cidade Rabat, de Susana Nobre
17 Godland, de Hlynur Pálmason
18 El Agua, de Elena López Riera
19 A Sibila, Eduardo Brito
20 Yoon, Ricardo Falcão, Pedro Figueiredo Neto
Os Piores Filmes de 2023
Barbie, de Greta Gerwig
Oppenheimer, de Christopher Nolan
Killers of The Flower Moon, de Martin Scorsese
Napoleon, de Ridley Scott
Knock At The Cabin, de M. Night Shyamalan
Maestro, de Bradley Cooper
May December, de Todd Haynes