Mal Viver, de João Canijo: Mãe Há Só Uma

Em Mal Viver, João Canijo reúne as atrizes com que trabalhara em Sangue do Meu Sangue (2011) e Fátima (2017), entre outros projetos. O seu novo filme decorre em Fão, vila do concelho de Esposende, onde as protagonistas trabalham na gerência do hotel de família. Cinco mulheres, três gerações diferentes, um ninho de cobras.

Os temas em mão são a maternidade e a família, mas engane-se quem pense que Mal Viver explora minimamente qualquer um dos dois. De micro-agressões a agressões físicas, estamos perante a família mais tóxica concebível. O nível de animosidade é tal que chega a ser anedótico.

Madalena Almeida, Rita Blanco e Anabela Moreira em “Mal Viver”

Desde as primeiras cenas que o mal-estar e os ataques são constantes, sem qualquer gradação ou progressiva exaltação dos ânimos. Neste hotel, não há qualquer réstia de amor nem esperança num futuro melhor. Estas mulheres estão condenadas a odiarem-se – a si mesmas e umas às outras. Infelizmente, também o espectador está condenado a assistir.

Anabela Moreira, o destaque do elenco, faz o melhor que pode com um papel que funciona apenas como saco de boxe das restantes mulheres da família. Chega ao ponto de ser desconfortável assistir ao quão mal-tratada é Piedade, personagem que, note-se, sofre de depressão.

Cleia Almeida em “Mal Viver”

O trabalho de Leonor Teles como diretora de fotografia é dos poucos aspetos que se aproveitam, se bem que por vezes pareçam incompatíveis as suas imagens (formais, elegantes, bem iluminadas) com o suposto estado decadente do hotel. As personagens falam de baratas e tectos com bolor, mas nunca vemos provas de tal.

Mal Viver estreou no Festival de Berlim, juntamente com o seu filme-irmão Viver Mal, onde arrecadou o Prémio do Júri. Se todos gostássemos do mesmo, o que seria do amarelo? Uma recomendação ao leitor: para um filme sobre mommy issues, ficará mais bem servido com os recentes Saint Omer (de Alice Diop) ou Beau is Afraid (de Ari Aster).

Pedro Barriga