Dossier Michael Mann, Vol. VIII – Collateral

Francisco SousaJaneiro 19, 2024

Michael Mann regressou em 2004 com o filme Collateral, um thriller neo-noir que, tal como fez em Heat na década anterior, juntou duas das maiores estrelas de Hollywood à época: Tom Cruise e Jamie Foxx. Max (Foxx) é um taxista de Los Angeles que sonha em abrir a sua própria companhia de limousines mas que vê os seus planos serem alterados quando aceita transportar Vincent (Cruise), um assassino profissional. Vincent rapta Max e obriga-o a conduzir o taxi ao longo de Los Angeles enquanto elimina diversas testemunhas de um caso ligado ao tráfico de droga.

Um filme de ação sempre em movimento, que não dá tempo ao espectador para respirar, entre cenas de ação viscerais e desorientantes (o tiroteio na discoteca é das melhores cenas na filmografia do realizador norte americano) e diálogos convincentes entre Vincent e Max que tornam os dois protagonistas em personagens obrigatórias no universo Mann. Collateral está ainda recheado de personagens secundárias memoráveis, interpretadas por atores de grande calibre (Jada Pinkett Smith como a procuradora e interesse amoroso de Max, Javier Bardem como barão da droga e, por último, mas não menos importante, Mark Rufallo como detetive da polícia de Los Angeles). Collateral tem ainda uma das melhores performances de Cruise, onde interpreta de forma convincente um vilão implacável, uma máquina assassina, animalesco e assustador, num papel diametralmente diferente às personagens que o tornaram famoso.

O oitavo filme do realizador norte americano marca um ponto importante na filmografia do autor natural de Chicago. Apesar de já ter realizado algumas experiências em Ali, foi em Collateral que a paixão de Mann pela fotografia digital se consolidou e onde se tornou um apanágio dos seus filmes. Ao contrário da opinião geral em 2004, que considerou a fotografia do filme confusa e uma distração, o digital oferece ao filme um look distinto e confere uma dimensão mecânica e robótica, aos protagonistas, especialmente a Vincent. Ficam ainda na memória as paisagens noturnas de Los Angeles visíveis no plano de fundo, as luzes carregadas de laranja e azul, que se refletem e refratem e se estendem durante quilómetros até ao horizonte, tornando a cidade num local hostil e solitário:

Whenever I’m here I can’t wait to leave – too sprawled out, disconnected

Se a fotografia digital é uma pseudo-novidade no filme, os temas explorados em Collateral são já os clássicos em toda a obra de Michael Mann. O machismo das personagens, a obsessão com o perfeccionismo e o profissionalismo, a solidão e o isolamento; e o desejo intrínseco (acompanhado quase sempre pela inércia) em escapar da rotina e partir para outra vida. 20 anos depois, Collateral continua a ser dos filmes menos falados de Mann, e nem sempre associado ao realizador, mas é uma cápsula de tudo aquilo que este fez ao longo de toda a sua carreira.

Francisco Sousa