Dossier Francis Ford Coppola, Vol. I – The Godfather (1972)

Pedro BarrigaOutubro 4, 2024

É difícil falar de The Godfather sem soar desproporcionado. O filme mais marcante da filmografia de Francis Ford Coppola será talvez o filme mais marcante dos últimos 50 anos do cinema americano – há quem diga de sempre.

O maior atestado da sua intemporalidade é a extensa lista de planos, cenas e sequências gravados na nossa memória e na memória do cinema. Como o do carro envolto pela seara e observado pela distante Estátua da Liberdade, qual testemunha do assassinato prestes a ser cometido. Como o do presente ensanguentado na cama de Jack Woltz. Como o de Sonny chegado à portagem para uma emboscada fatal. Como o de Michael Corleone na casa-de-banho a agarrar a cabeça. Mãos na cabeça, mãos na massa, mãos na pistola, mãos apunhaladas.

São planos que se destacam pelo seu uso da luz ou por falta dela. Veja-se o solarengo casamento de Connie Corleone, intercalado pelas cenas no sombrio escritório de Don Vito (Marlon Brando). São as conversas ao escuro que permitem a vida farta que a família leva em plena luz do dia. É também curioso que Michael (soberbo Al Pacino), o único filho alheado aos negócios da família, se encontre sentado numa mesa no exterior, mas à sombra. Uma linha que Michael sempre percorreu com dificuldade e cuja transposição observamos ao longo de The Godfather. Um filme no qual os temas informam as imagens e as imagens informam os temas, como deveria sempre ser.

Com The Godfather, Coppola traça uma visão da América, algo que sempre fez ao longo da sua carreira. Quer seja na sua exploração da Guerra do Vietname em Apocalypse Now, quer seja na cidade em declínio de New York / New Rome em Megalopolis. A história dos Estados Unidos confunde-se com as histórias de Coppola, talvez o maior cronista da nação.

 

Pedro Barriga