Ne t’inquiète pas chérie. O novo thriller de Olivia Wilde, também categorizado como mistério e drama, oferece-nos uma cinematografia irrepreensível, repleto de bons frames assim como uma banda sonora recheada de clássicos. Contudo, nem a estética aprazível nem a veracidade e autenticidade do design e custom da obra, lhe conferem um resultado que não seja o de medíocre. A somar a isto, a nossa curiosidade foi aguçada pelas inúmeras polémicas que precederam a sua estreia e que criaram, no espectador, algumas expectativas.
Olivia Wilde assina um filme que se foca numa comunidade experimental e utópica num estado americano em construção (Victory Project), não obstante o seu lado elegante e glamoroso esconder inquietantes segredos, revelações conturbadas e um desassossego contínuo. Esta construção idílica de um espaço para a família, no qual o homem trabalha no escritório e a mulher se encarrega das tarefas domésticas, servindo e contribuindo para a prosperidade e sucesso do lar, faz-nos lembrar a série distópica The Handmaid’s Tale. A associação ou semelhança de conteúdo entre ambas não me parece tanto uma crítica ao passado sexista, machista e patriarcal (apesar de o ser) mas sim uma chamada de atenção para a possibilidade de um retorno destes tempos, nomeadamente pela crescente ascendência ao poder de partidos ligados ao conservadorismo, extrema-direita e ao fascismo.
Por conseguinte, este foco na hierarquia e na posição que homem e mulher desempenham na sociedade, levam-nos a considerar que o filme, apesar de se passar nos anos 60, traduz o retrocesso social comparativamente à evolução tecnológica deste período. Uma família com poder de compra teria a capacidade de adquirir os mais modernos electrodomésticos e aparelhos, ainda assim, a mulher ocupava os seus dias a cozinhar, limpar e cuidar do lar.
Don’t Worry Darling é pois, um filme intrigante e provocador, todavia, nunca encontra a sua verdadeira identidade. Toda a estética envolvente – o céu azul, os jardins verdes, os vestidos coloridos, as jóias, a mobiliária retro-vintage, os pequenos-almoços de ovos, bacon estaladiço, café americano e torradas – alicia os nossos olhos e estimula os nossos sentidos, porém, o argumento perde-se na tentativa pretensiosa de fazer algo ímpar mas que já visualizámos incontáveis vezes.
Na verdade, Don’t Worry Darling inspira-se em demasia noutras obras, fazendo com que perca a sua personalidade e seja somente uma sucessão de recortes de outros títulos do cinema (Mother!; Suspiria; Get Out; Gone Girl; The Girl on The Train). Apesar deste filme ter sido feito à medida de Florence Pugh, esta revela-se algo imatura no papel de jovem esposa. Por sua vez, Chris Pine está exemplar como vilão mas eis que Harry Styles surge como a nódoa do acting. A sua prestação é insegura, insuficiente e inconsistente. Num argumento algo confuso e que se apresenta numa correria desenfreada, o filme corre quando deveria abrandar e detém-se quando se deveria apressar. Com efeito, não será o sucessivo bailado visual e estético que nos irá ludibriar, muito menos nos fará anuir no que diz respeito ao resultado final.
Sintetizando, estamos perante um filme glamoroso, visualmente atractivo, apelativo em termos de sonoplastia mas sobretudo perturbador. A sensação de incómodo e desconforto acompanha-nos até ao fim. A lógica e o nexo raramente dominam o rumo da acção. Desde cedo que o espectador se apercebe do desenrolar expectável e prevísivel dos acontecimentos, sugerindo que a realizadora se preocupa mais com a estética do que com a congruência que deverá tomar a trajectória narrativa. Por fim, deixo notas positivas para o décor, guarda-roupa, banda sonora e a prestação de Florence Pugh que carrega todo este lugar-comum às costas.