Apanha-me Se Puderes, 20 anos Depois

Com uma carreira com mais de 50 anos, Steven Spielberg é um dos realizadores mais famosos e aclamados da história do cinema norte americano. Spielberg, que faz parte do grupo de cineastas que surgiu durante o movimento de New Hollywood (juntamente com nomes como Francis Ford Coppola, Peter Bogdanovich, Martin Scorsese), revolucionou o blockbuster moderno, começando por Jaws,  e tornou-se no realizador mais bem sucedido de sempre em termos de bilheteira.

Com 75 anos, o cineasta estadunidense tem uma obra muita vasta e em 2022 continua a realizar e produzir. Se em 2021 surpreendeu com o remake do musical West Side Story, este ano Steven Spielberg realizou aquele que porventura será um dos filmes mais pessoais e autobiográficos: Os Fabelmans, com estreia em Portugal no dia 22 de Dezembro.

No entanto, em 2022 faz 20 anos que foi lançado um filme que nem sempre é referido nos melhores da sua filmografia e que por vezes é algo subvalorizado: Apanha-me Se Puderes.

Apanha-me Se Puderes é um filme que se encaixa perfeitamente na filmografia de Spielberg quando consideramos a totalidade da sua obra. A carreira da maior parte dos realizadores é altamente influenciada pelas suas experiências na juventude e a de Spielberg não é diferente. Com uma adolescência marcada pelo divórcio dos pais e consequente afastamento do pai da sua vida, a filmografia do cineasta norte americano está marcada por famílias monoparentais, geralmente com pais ausentes (E.T, Encontros Imediatos de Terceiro Grau, Indiana Jones e a Última Cruzada, entre outros) e numa procura constante de reconhecimento por parte da figura paternal.

Por esta razão, é fácil considerar Apanha-Me Se Puderes como um dos filmes mais autobiográficos da sua carreira, que utiliza a história de Frank Abegnale Jr. (Leonardo DiCaprio) um jovem de 15 anos que, devastado pelo divórcio dos pais e pela difícil decisão de escolher entre viver com o pai ou a mãe, decide fugir e utilizar o seu carisma e confiança para se fazer passar por piloto da PANAM, médico e advogado enquanto falsificava cheques no valor de milhões de dólares. Tal como Frank, também Spielberg esteve constantemente em mudança quando era novo e, alegadamente, começou a sua carreira de cineasta ao infiltrar-se nos estúdios da Universal, fazendo-se passar por trabalhador até que de facto começou a ser integrado nos estúdios.

Paralelamente, Frank começa a ser investigado e perseguido por Carl Hanratty (Tom Hanks), um agente do FBI cujo divórcio levou a um contacto com a filha cada vez mais esporádico. A solidão das duas personagens principais do filme e a constante perseguição leva-os a estabelecer uma relação de aparente amizade, pautada por conversas telefónicas no dia de Natal, que culmina no final do filme com Carl a ocupar o papel de pai adotivo de Frank (outro tema recorrente na filmografia de Spielberg, presente no Resgate do Soldado Ryan, por exemplo).

Filmado por Janusz Kaminskyi e com uma banda sonora composta por John Williams, colaboradores habituais de Spielberg, o filme transporta-nos com mestria para os anos 60 e Leonardo DiCaprio, na altura com 28 anos, representa a confiança e ingenuidade de um jovem de 17 anos de forma muito convincente, naquele que é um dos seus melhores papeis. Destaque ainda para Christopher Walken que teve neste filme um regresso à melhor forma e uma nomeação ao Óscar de melhor ator secundário ao representar Frank Abegnale Sr.

Apanha-me Se Puderes não é o filme mais icónico nem o primeiro que vem à cabeça quando falamos da obra total de Steven Spielberg. No entanto, 20 anos depois, o 21º filme do realizador norte-americano merece o seu lugar no panteão dos melhores filmes da sua obra e sem dúvida aquele que, até à estreia de Os Fabelmans, reflete de maneira mais íntima a vida de Spielberg.

Francisco Sousa